19/05/2020

O Futuro


foto Jaime Bulhosa

Adoro ouvir conversas alheias, basicamente sou um cusco. Ou não estivesse eu no facebook. Mas gosto sobretudo de ouvir pessoas mais velhas a falar, tanto como gosto de ler livros antigos. Há sempre neles um conhecimento, uma sabedoria que só o tempo rectifica.

Fui tomar um café e perto da minha mesa encontrava-se uma senhora que dizia que tinha noventa e dois anos. Alguém lhe perguntou se não tinha medo de sair à rua por causa do vírus. Ela afirmou que sim, evidentemente. Porém, respondeu que não tinha tempo para viver na perspectiva do futuro e que o destino era um mistério que a natureza não permite desvendar. Acrescentou que tinha que viver o presente, porque imaginar o futuro é uma agonia sem desenlace. 

12/05/2020

A Distopia é a Utopia



George Orwell, logo no início do seu livro, “1984” anunciava os princípios do “Doublethink”: "A Guerra é Paz", "A Liberdade é Escravidão", "Ignorância é Força". Conceitos totalmente contraditórios que eram tomados como sinónimos. Assisto, hoje, um pouco por todo o lado aos mesmos princípios. No Brasil, os partidários de Bolsonaro, dizem ao seu povo que a morte faz parte da vida, a morte é tão natural que deve ser assimilada como normal. A morte é vida. Por cá, os amigos do Ventura proclamam o amor ao próximo. O amor deve ser praticado, mas o próximo é apenas aquele que é mais igual que o outro. O próximo não é o cigano, o negro, o homossexual, o esquerdista, o refugiado, etc. O valor da vida é sagrado, no entanto, a pena de morte é justa e por aí fora...

Vivemos num mundo em que o sinónimo é sinónimo de antónimo. A distância é amor. O isolamento é a liberdade do futuro. A doença é democrática. A falta de trabalho é responsabilidade. A vigilância é privacidade ou a negligência do outro. A distopia é a utopia. 

10/05/2020

Natureza Humana


Andei eu a vida toda a ler livros, aconselhados pelos intelectuais mais reputados, tão densos e profundos que nem sequer lhes penetrei a superfície; a ver filmes de realizadores cujos nomes não consigo pronunciar;  a assistir a espectáculos de teatro alternativo dos quais não percebi um boi;  a ouvir música, desde a erudita à pimba, etc., etc... para conseguir entender os mistérios da Natureza Humana.
Afinal está tudo, no facebook, escarrapachado!

09/05/2020

Os Imbecis



Trabalhei durante trinta três anos com livros. Não saí por opção. Tenho muitas saudades de algumas pessoas e de poder ler, praticamente, tudo o que me apetecia. Não sinto falta nenhuma do negócio dos livros.
O Caminho é em frente. Afinal de contas tudo muda. O mundo é hoje um sítio muito diferente do que era há dois anos, para não dizer há dois meses.
A experiência adquirida, neste meio, deu-me alguns créditos para poder falar sobre os livros e a leitura. Algumas pessoas perguntam-me: porque se lê tão pouco? Eu respondo-lhes: há quem diga que ler é um acto de inteligência. No entanto, acho que se trata muito mais de um acto de persistência e de esforço. O esforço de ler um texto com mais do que uma frase, como este, por exemplo.
Ler nem sempre é benéfico, pode até ser contraproducente se lermos apenas um livro, repetidamente, como se fosse uma verdade absoluta.

Durante longos anos cruzei-me com muitas pessoas interessantes e outras menos. Constatei que algumas têm livros em comum e que lhes servem como muletas e onde aprenderam todos os seus truques. Posso nomear pelo menos três livros que são obrigatórios ler, mas que ao serviço de um idiota podem ser perigosos. São os seguintes: A Arte da Guerra, de Sun Tzu, O Príncipe, de Maquiavel e A Arte de Ter Razão, de Arthur Schopenhauer. Poderia acrescentar mais uns tantos, mas não quero ferir susceptibilidades e desviar-me do essencial. Acredito que gente como Donald Trump, Jair Bolsonaro, André Ventura e outros que tais, irão ter cada vez mais adeptos. Como disse Nelson Rodrigues, o famoso escritor brasileiro: "Os imbecis acabarão por dominar o mundo, não pela sua capacidade, mas pela quantidade." 

07/05/2020

A Consciência

foto Jaime Bulhosa

O Sol continua a sua trajectória em volta do centro da galáxia. A Terra mantém-se a girar sobre si mesma. Os oceanos insistem no vai e vem das marés. O vento passa pelas folhas das árvores e faz soar os sinos da floresta. Os pássaros riscam, como um lápis, o céu azul. As flores lançam perfumes, cores em todos os espectros de luz visível. A natureza invade os espaços agora vazios. O Homem parece absolutamente dispensável. Mas para que serviria tudo isto sem uma consciência de tamanha beleza?

01/05/2020

#PELOSOUTROS


Estamos todos no mesmo barco!?...
Não, não estamos todos no mesmo barco e toda gente sabe disso. Os mais velhos não estão no mesmo barco. Os refugiados, os emigrantes e os que vivem noutros lugares do mundo não estão no mesmo barco. Os que não têm trabalho; os que nunca puderam ficar em casa; os invisíveis que moram na rua; os que nos recolhem o lixo; os que tratam dos doentes; os que nos fazem chegar a comida, a água a luz, o gás, etc. Os que estão sozinhos em casa, os que morreram... Não, não estamos todos no mesmo barco. A grande maioria de nós deseja voltar à "normalidade", à nossa zona de conforto. Porém, já não me parece possível. Alguma coisa tem que mudar!
O Homem rapidamente entendeu que um indivíduo egoísta vence um indivíduo altruísta. Mais tarde descobriu que um grupo altruísta vence um grupo egoísta. Agora temos que ser todos altruístas. Por isso, não adianta muito continuarmos a defender o nosso quintal. Não é útil o corporativismo, mesmo que seja em defesa de um quintal de merda que nunca foi protegido.

As grandes mudanças sempre foram feitas por pequenos grupos de pessoas, ou a partir de uma única pessoa, com um pensamento revolucionário. Hoje precisamos que todos mudem, para a construção de um Admirável Mundo Novo, mas sem as partes horríveis. Como isso pode ser feito, não sei e acho que ainda ninguém sabe. Mas todos sabemos que se não mudarmos afundar-nos-emos num oceano de ondas gigantes. Não no mesmo barco, mas numa arca, onde já entra água por todos os lados, chamada Planeta Terra.